sexta-feira, 20 de maio de 2011

A FESTA DO LADO 7

Entrevista de Jorge Viveiros de Castro a Sonia Coutinho

A editora 7 Letras, casa de pequeno porte que ganhou nome entre as melhores do país, prepara grandes transformações em sua atuação, a fim de acompanhar as mudanças no mercado livreiro. Afinal, estamos diante da chegada forte da tecnologia digital na área do livro, prometendo trazer maciçamente um dispositivo eletrônico como veículo alternativo para a leitura. Marcando a virada, no próximo dia 31 haverá o lançamento de uma nova revista, a Lado7, com duplo formato impresso e digital, na Livraria Travessa do Shopping Leblon. Jorge Viveiros de Castro, o editor – meu editor - começou a editar livros quase menino.

SC - Jorge, você já está com a editora 7 Letras há bastante tempo, não? Há quanto tempo, mesmo? Que idade tinha, quando se tornou editor?
JVC - Comecei a trabalhar como livreiro em 1988, aos 21 anos. Fundei a Editora Diadorim em 1993, e logo em 1994 passei para a 7Letras – portanto posso dizer que sou editor desde os 26 anos, e hoje a editora está quase chegando à maioridade, com 17 anos de estrada.
SC - Fale um pouco desse percurso, lembre alguns episódios que marcaram você.
JVC - Posso dividir a trajetória da 7Letras em 3 fases. No início a editora funcionava dentro de uma pequena livraria, e comecei a trabalhar com livros em pequena tiragem, especialmente de poesia, que lançávamos na própria livraria. Nessa época fazia tudo praticamente sozinho, com a ajuda de uma estagiária.
Alguns anos depois a editora se separou da livraria e passou a publicar um número maior de títulos acadêmicos, principalmente na área das ciências sociais. Desde então o catálogo da editora foi crescendo em número de títulos e em variedade de gêneros, também com muitas coedições. Durante essa etapa a editora se profissionalizou como empresa, e passei a atuar mais no setor administrativo – ainda que sem perder o foco na questão editorial, bem como tentando não deixar de lado a paixão pela leitura.
A terceira fase teve início quando nos mudamos para a sede atual, em Botafogo, e montamos um estúdio de gravação para ampliar as experiências de criação editorial já tendo em vista a chegada das novas ferramentas e dispositivos de leitura em formato digital, que permitirão o trabalho com áudio e vídeo como complemento da leitura. De certa forma, esta fase marca também uma volta às origens, pois estamos novamente trabalhando com poesia em pequenas tiragens, agora agregando aos livros gravações em áudio dos poetas para veiculação online em formato digital.
Posso lembrar de vários episódios marcantes, como o dia em que o depósito da editora (que ficava no subsolo da livraria) inundou numa daquelas enchentes de verão e tivemos que fazer uma verdadeira “operação de guerra” para salvar os livros – contando inclusive com a inestimável ajuda do poeta Carlito Azevedo, editor da revista Inimigo Rumor e um dos principais autores do catálogo da 7Letras até hoje.

SC - A 7 Letras lançou vários dos melhores autores da nova geração brasileira. Como você se sente, com relação a isso?
JVC - Tenho orgulho da trajetória da 7Letras, e de ver reconhecido o trabalho de muitos autores em quem apostamos desde o primeiro instante, ainda quando eram inéditos.

SC - Tem alguma coisa a dizer sobre a literatura no Brasil, agora? Acha que está saudável, ou é doente terminal, como dizem alguns?
JVC - Acho que está muito saudável. Há muitos jovens escrevendo, muito mais do que na minha geração; o acesso à informação e até mesmo à leitura vem sendo ampliado com as novas tecnologias desde o surgimento do computador e da internet, e vejo com bons olhos o surgimento de escritores jovens – tanto poetas quanto contistas e romancistas – que falam (e escrevem, ou traduzem) a língua de seu tempo, com talento e criatividade. O mais difícil é a boa literatura chegar a um número expressivo de leitores, em meio a um mar de obras estrangeiras e dos gêneros de consumo rápido tipo autoajuda e similares. Mas ela existe, como sempre, e também está sendo produzida justo agora por uma nova geração que praticamente já nasceu na era da informática. Sem falar nos autores já estabelecidos e ainda atuantes. SC - Que tal essa atividade de editor? É exaustiva? É gratificante? Qual é o saldo de tudo isso, neste momento?
JVC - Ufa, confesso que tenho de parar pra pensar. É exautiva sim. É gratificante também. De certa forma parece que não saí do lugar: estou com uns três arquivos abertos aqui no fundo dessa mesma tela nesse exato momento, cada um com um livro inédito em processo de edição, como parece que passei cada dia desses quase 20 anos de atividade editorial. Posso dizer que é difícil trabalhar com livros, mas fico feliz de ter conseguido construir minha própria editora como uma casa aberta aos autores brasileiros, e vê-la hoje tão cheia de gente talentosa.

SC - Além de editor, você é escritor. Foi um precursor do chamado miniconto entre nós. Acha que conseguirá levar as duas coisas? Temos outros exemplos de editores que são também escritores.
JVC – Atualmente, o tempo da escrita parece cada vez mais raro, especialmente nessa fase de implementação dos livros em formato digital, que exige novos saberes, investigações e investimentos. Procuro não deixar de lado a leitura dos autores mais diversos – além da literatura, gosto de obras científicas, especialmente nos campos da matemática, biologia e história – para que as ideias continuem fluindo. Um dia a coisa explode e algum dos projetos literários toma forma. Ou não. Espero que sim, tenho muito material bruto espalhado em arquivos e cadernos, algumas ideias recorrentes e alguns projetos em andamento. Pelo menos não tenho dificuldade para encontrar uma editora!

SC - A 7 Letras está lançando uma revista importante, a Lado 7. Antes, você tinha a Ficções. Diga alguma coisa sobre o projeto da nova revista.
JVC - A revista Lado7 marca a entrada da editora no mundo dos formatos digitais. Além de contos, poemas e ensaios, a revista pretende ampliar o diálogo e a interação entre os diversos gêneros, convidando artistas plásticos e quadrinistas e também utilizando os recursos de sons e imagens que estão se aprimorando com as novas mídias. O mais importante é criar e expandir um campo de experimentação, aberto a descobertas – tanto de novos autores e obras quanto de novos processos editoriais.
SC - Como é que a 7 Letras se posiciona diante da chegada do livro digital? O que você pretende fazer, com sua editora, com relação a isso?
JVC - Estamos ainda engatinhando, como a própria indústria do livro. A intenção da editora é seguir com as ideias plantadas no projeto “Lado7” (e resumidas no conceito da revista), e utilizar de maneira criativa todo o repertório de recursos que ajudem a multiplicar as experiências da leitura para o maior número possível de leitores. Vejo o livro digital como um suporte a mais, um complemento para a experiência (insubstituível) da leitura em papel, e que precisa ser explorado como um terreno ainda desconhecido, com muita coisa ainda a ser descoberta e aprimorada.

2 comentários:

  1. Sonia, a poeta grapiúna Genny Xavier está com um artigo no meu blog. Seria bacana um comentário seu.
    Tudo de bom.

    O Falcão Maltês

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  2. -

    Ainda o sono agoniado
    e o desatino de poeta
    de coitos em noites de sortilégios
    de urbes medievais inconquistáveis
    e aventuras rosáceas

    Ainda os encantos inventados
    piratas, alienígenas e vampiros à espreita
    o mistério da terra e da semente
    o olhar dadaísta
    e sustos cíclicos de menino

    Ainda o mundo sem fim
    o coração aos saltos
    a alma líquida e insone
    a dúvida lânguida
    o céu e os rios, a chuva e o sol

    E sobre os versos imperfeitos
    o espírito inquieto
    a melodia fraterna
    a fauna invisível
    o tempo que não volta mais

    Ainda a alquimia da vida
    o abraço sentido
    núpcias de línguas de fogo
    o desânimo de patas e focinhos
    e a compaixão em um universo molusco

    E nos subúrbios
    na aridez do sertão
    nas montanhas lá de longe
    nos recantos obscuros
    no fulgor das trevas:
    fadigas e fragilidades
    aranhas e formigas
    insultos e armadilhas
    a textura do amor que cega
    nos cobrindo de beijos e cravos

    Ainda o amor cálido se derramando
    vestido de púrpura, de prata, de delicadeza
    à espera do simples e do justo


    ANTONIO NAHUD JÚNIOR

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