sexta-feira, 20 de maio de 2011

CADERNO DE POESIA

DINU FLAMAND
TRADUÇÃO SONIA COUTINHO ANIMA MAL NATA

o vento levanta de repente um redemoinho enfumaçado
um gato caminha a passos lentos sobre o muro
pensando que talvez os pardais não saibam mais voar

leio sobre os infelizes
que herdam a anima mal nata
um sinal de nascença - mas na alma

e enquanto a confusão persiste – o fundo
da minha interioridade explodindo para fora –
prossigo com a mesma tristeza carnívora

enfrentando todos os obstáculos sem saber porquê
quando ficaria satisfeito com a sombra clara da tua axila
e o migratório triângulo em teu ventre...

PRESO

Ela chega com um cheiro de pele quente
da cama de outro
tira do cabelo um sol cheio de grama
e estende a mão
entre seus dedos a água toma a forma de um copo
enquanto ela envia para as profundezas a emoção de um beijo esquecido.

Uma felicidade amuralhada a protege do sono
como uma fortaleza
ela está impregnada de uma densa fosforescência
intangível
enquanto pulsa em minha direção
de uma distância insuportavelmente
próxima
onde me afogo em anos luz de encargos.

Eu abriria já o meu peito para recebê-la
bem dentro do meu silêncio
ruidoso
nos verdes cumes de Abril
mas nenhuma das minhas palavras a atinge
e fico à espera
preso no latido do eco vazio
que me repete.

O poeta e tradutor premiado Dinu Flamand faz jornalismo em Bucarest



NARLAN MATOS TEIXEIRA ELEGIA AO NOVO MUNDO

Tu me perguntas meu amigo
Onde eu estive durante meu longo silêncio

.........Estive na açucena das canas e na amargura dos canaviais
......................onde as folhas tremiam de medo dos homens

.........Os canaviais me sussuraram em gritos horrendos
.......................o sangue amargo que lhe adocicou a boca
.........As mãos ásperas que lhe enxugaram a face
.........O canavial que morria de fome antes de completer 27 anos de idade
.........Das vozes sem estrela que embalavam ao longe línguas estranhas
.........Ó canavial verde, de que cor é meu sangue vermelho ?
.........Meu sangue tem medo da morte do açoite da noite
.........Meu sangue tem medo de mim

Tu me perguntas meu amigo
Onde eu estive durante meu longo silêncio

.........Eu estive nos navios negreiros mercantes
.......................que mercaram meu destino até a América até agora
.........beberam minhas lendas como se bebe um barril de rum podre
........ mercaram cada estrela do céu e do mar infinito
.........cada pássaro cada pluma de meu cocar
.........e desenharam mapas com meu sangue
.........e ergueram totens sobre minha tribo
.........e atearam fogo nos campos sagrados do meu povo
.........e suas lanças me repartiram as veias em continentes distantes diferentes

Tu me perguntas meu amigo
Onde eu estive durante meu longo silêncio

..........Estive pelas escumas dos mares nunca d’antes
..........Por onde vieram a pólvora a baioneta o espelho a tuberculose a siflis
..........Por onde vieram a espada e o elmo



....................................As nuvens jamais se esquecerão disso!


No atlântico negro
Nos tombadilhos de velhos navios piratas
Nos calabouços da crueldade humana
Nas prisões da Serra Leoa – que ainda doem em alguma dobra do meu corpo
Em Angola
Na Guiné-Bissau
No Senegal
No Benin
Estive no reino da Guatemala
E na provincia de Yucatán
E na provincia de Cartagena de las Indias
E nos grandes reinos e grande provincia do Peru
E no novo reino de Granada
E nas ilhas de Cuba e Trinidad
E nos reino dos Aztecas
Onde espadas de brutalidade fenderam meu corpo nu
Onde os cães de caça dos barões das índias se alimentavam dos braços e das pernas de crianças indefesas

Tu me perguntas onde eu estive meu amigo
E somente agora posso quebrar meu silêncio:
Eu estive comigo.



O baiano Narlan Matos Teixeira é professor nos Estados Unidos, em Urbana-Champaign



HENRIQUE WAGNER AUTO-RETRATO

Entre uma cidade
e outra, os bois
comem capim.
Os homens de baixa estatura
jogam tênis de mesa
e suas esposas fazem
uma sempre cheirosa
torta de maçã.
Não é que seja importante
o tipo de recheio ou a massa
usada na torta.
Há, no entanto, no tênis de mesa,
aqueles que ganham e aqueles
que perdem. Os homens
de alta estatura vivem
pendurados feito suas gravatas,
o rosto brilhando de suor.
Entre uma cidade
e outra, o cheiro é de
silêncio mastigado
e estrume de boi. E de vaca.

PARA AMARRAR O CADARÇO
a Sarah Kane

Basta escolher mãos
pequenas e ágeis
e ler o Tesouro da Juventude
ao pé da letra.
É preferível usar
tênis vermelhos
a brancos, sempre.
Há que tirar manga
do pé e participar
das gincanas do colégio,
ainda que as mocinhas
finjam desprezo ou insatisfação.
Jamais esquecer que a mãe
faz a nossa vitamina
de banana, quando ainda
estamos bêbados de sono,
e no entanto, evitar
agradecimentos óbvios.
Encher o caderno
de dez matérias
com desenhos de monstros
nervosos e nojentos.
Fazer tudo o que possa
ser feito como se
não estivesse
usando óculos.
Deixar as calças rotas
de tanto cair no chão,
na hora da pelada,
e de vez em quando
ser chamado ao S.O.E.
Amar, distintamente, a namorada,
quando não for mais
possível amá-la
de verdade.
Porque o segredo mesmo
está na qualidade
do cadarço.



Henrique Wagner faz jornalismo cultural em Salvador

Um comentário:

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