segunda-feira, 27 de julho de 2009

COMO É QUE CAROLA ESCREVE?

Carola Saavedra

Carola Saavedra é destaque na nova geração de escritoras brasileiras. Depois de publicar um livro de contos, “Do lado de fora”, pela 7 Letras, em 2005, ela já publicou dois romances, “Toda Terça”, 2007, e “Flores azuis”, 2008, ambos pela Companhia das Letras. Carola está preparando outro livro, mas ainda não fala dele. Mas conta como está escrevendo.
SC: Como é sua maneira de trabalhar?
CS: Varia de acordo com o que estou escrevendo. Até agora, cada livro teve um processo diferente. O “Toda Terça” foi um exercício de erros e acertos, constantemente eu me sentia num beco sem saída. O “Flores azuis” estava todo pronto na minha cabeça antes de eu começar a escrevê-lo, e o trabalho foi mais com a linguagem. E, no caso do novo romance (ainda falta muito para terminá-lo), a história vai se revelando na medida em que escrevo.
SC: Você escreve todo dia?
CS: Tento escrever todos os dias, de Segunda a Segunda. Claro que não é uma regra fixa, às vezes a vida simplesmente não permite e sou obrigada a me adaptar. Nos últimos anos, aprendi a aceitar que não é possível planejar, controlar tudo, muito menos o trabalho literário que, no meu caso, depende muito do meu equilíbrio emocional. Mas, dentro do possível, procuro manter esse ritmo diário.
SC: Durante quanto tempo?
CS: Em média, dedico umas quatro horas por dia à literatura.
SC: O horário é fixo, ou varia segundo a disposição?
CS: Sou muito disciplinada para trabalhar, procuro seguir horários fixos, acordar cedo etc. Mas, claro, a “torre de marfim” nunca é impermeável. Ainda bem.

SANTE SCALDAFERRI E A BELEZA QUE VEM DA FEIÚRA

Sante Scaldaferri

O pintor, gravador, ator e cenógrafo Sante Scaldaferri, um constante pesquisador das novas técnicas artísticas, é atualmente o grande veterano das artes visuais na Bahia. Ele participou três vezes da Bienal de São Paulo, expôs obras na Argentina, Cuenca, Cuba etc. Fui conversar com Sante na casa dele, em Itapuã, vizinha da casa onde morava o saudoso grande/pequeno Calasans Neto.
Sante, como Calasans, é um dos integrantes da famosa Geração Mapa, que se reuniu em torno da revista com o mesmo nome, no final dos anos 50 e entrando pelos anos 60, um pessoal que marcou uma virada na cultura baiana.
Além de Sante e Calá, havia Glauber Rocha, Paulo Gil Soares, Carlos Anísio Melhor, todos estes já desaparecidos, restando os atuantes Fernando da Rocha Peres e Florisvaldo Mattos, entre outros.
Para mim, foi uma emoção grande chegar na bonita casa de Sante, com quadros cobrindo todas as paredes e uma piscina azul-esverdeada no jardim. Toda essa época da cultura baiana estava refletida ali e, de repente, fui tomada por muitas lembranças.
Em seus 81 anos, Sante, que continua sempre brincalhão e surpreende pela contínua renovação do seu trabalho. De uns anos para cá, ele vem usando o computador para criar obras muito originais, numa mistura de raiz popular com high-tech.

O amigo do homem, óleo sobre tela

A obra de Sante Scaldaferri já teve várias fases. A mais marcante é, provavelmente, a que se iniciou no final dos anos 70, coincidindo com o surgimento do neo-expressionismo alemão, tal como floresceu nos anos 80, com um bom número de pintores do “feio”, como Georg Baselitz e Sigmar Polke. Outras influências podem ter sido a Transvanguarda italiana, a Figuration Libre fancesa e a bad painting americana. Sante, sempre pesquisando, não resta dúvida de que teve contato com tudo isso. Um grande amigo seu nesse período, e que apreciava sua obra, era o crítico Frederico Morais.
Os movimentos citados caracterizaram-se por uma nova valorização da pintura, depois de uma longa fase de “desmaterialização” da obra arte, e também por uma acentuada presença do “feio”, contraposta aos cânones convencionais do “belo.”
Mas as possíveis influências, em Sante, não minimizam sua colocação de um universo muito pessoal, com um toque de “comicidade popular,” através das deformações irônicas das suas figuras e do aparecimento constante das figuras transformadas de ex-votos.
A visceral ligação dele com o entorno baiano está presente também numa religiosidade barroca que aparece marcadamente nas inúmeras e originais imagens de Cristo que ele tem produzido. (Sante me deu uma gravura com um Cristo “scorso”. Eu não sabia o que quer dizer isso, mas Sante garantiu que só sabe quem cursou a Escola de Belas Artes...)
Curiosamente, com seus elementos de feiúra e grotesco, e seu repúdio ao convencional, a arte de Sante Scaldaferri dos anos mais recentes surpreende pela “juventude”. São obras que não têm nada a ver com o “bonitinho para enfeitar a sala,” mesmo que isso tenha, como ele disse, prejudicado as vendas para um público menos informado.
Recentemente, saiu um livro sobre a obra de Sante Scaldaferri, de autoria do professor Aldo Tripodi. O título é sugestivo: “Uma poética do feio.”
Na apresentação do livro, vem um sumário das atividades do artista: participou do movimento cultural que originou a Revista Mapa; colaborou com o Cinema Novo, como cenógrafo e ator; foi asssitente da arquiteta Lina Bo Bardi na implantação do Museu de Arte Moderna da Bahia, no Solar do Unhão; no Pelourinho, deu cursos de técnicas artesanais para jovens e crianças carentes. Adiante, o professor Aldo Tripodi relaciona a arte de Sante Scaldaferri à vertente expressionista.
Então, vai aí um pouquinho da conversa altamente informal que tive com Sante Scaldaferri.


Os prisioneiros do pecado

SC: Sante, quero saber quando e como foi que você começou a pintar.
SS: Diversas pessoas ficam espantadas quando digo, mas é um dom do Espírito Santo. O Espírito Santo dá a cada pessoa um dom que é chamado de “carisma.” Então, o meu carisma foi ser artista. Desde pequeno. Eu tinha todos os meus desenhos, até os que fiz durante o curso primário. Guardei tudo: os coelhinhos, as paisagens, a paisagem com a chaminezinha, a marinha com os barquinhos, etc. Quando me mudei aqui para Itapuã, a umidade fez tudo deteriorar. Fiquei tão chateado... Mas a minha família nunca me apoiou em nada, nesse caminho da arte. Meus pais queriam que eu fosse dentista ou médico e aí me botaram num curso de matemática, para fazer o vestibular de engenharia. Quando cheguei na porta, do lugar onde davam o curso, disse para mim mesmo: “Não vou entrar aí coisa nenhuma!” e me mandei. Sabia que perderia o vestibular. Com isso, fiquei vadiando um ano inteiro. Um dia, vi no jornal: “Estão abertas as inscrições para desenho.” Cursei desenho, fiz o vestibular para Belas Artes e passei. Mas só porque a Escola estava precisando de alunos, tinha apenas oito...


A escalada

SC: Fale dos seus contatos com a Geração Mapa.
SS: Em 1957, mais ou menos, na época em que eu ia me formar em Belas Artes, eu estava caminhando pela Rua Chile... Todo dia eu ia para a Rua Chile. Dava uma voltinha por ali, e via os “intelectuais” sempre reunidos na porta da Livraria Civilização Brasileira. Mas então, um dia, vi um cara olhando para mim e pensei “Pô, esse cara é veado. Ele vem atrás de mim”. E senti uma mão em minhas costas. A pessoa disse: “Você vai trabalhar em meu filme”. Começou nossa amizade.
SC: Mas, quem era esse cara?
SS: Glauber Rocha. Era o início do cinema baiano. Foi feito o “Barravento.” Mais tarde, Glauber me chamou para trabalhar em “O dragão da maldade contra o santo guerreiro”. Fiz estandartes para o filme e também fiz nele o papel de um guia de cego. Me realizei como o guia do cego. Não dizia uma só palavra...
SC: Estou lembrando outra figura central do grupo Mapa, o poeta Paulo Gil Soares.
SS: Uma semana antes de Paulo Gil morrer, ele me telefonou. Eu disse :”Ó rapaz, como vai?” E ele respondeu: “Reze por mim”. Eu perguntei: “Mas o que há?” E ele disse: “Nada, mas reze por mim”. Uma semana depois, morreu. Tomando banho, com o chuveiro ligado...o filho é que achou ele lá.
SC: Eu gostava muito do Paulo Gil. Houve período, aliás, em que ele se dizia apaixonada por mim... Paulo era muito doido. Parece que uma vez ele pintou os cabelos de verde e saiu por aí assim.
SS: Em ele fazia essas coisas e tinha essas paixões mesmo... Estou lembrando outra coisa, uma história com Paulo Gil. Uma vez, em Cachoeira, fomos até a Ordem Terceira, que ainda não estava restaurada. O chão estava todo podre. Paulo viu alguma coisa e disse: “Ali tem um santo e é meu.” Ele foi e pegou a coisa que, na verdade, era um morcego. Paulo Gil soltou um grande grito. Naquele tempo, nós encontrávamos em Cachoeira vários santos assim, abandonados. Mesmo antigo, quando o santo ficava estragado o pessoal o colocava atrás dos altares. Então, a gente ia espiar atrás dos altares e encontrava uma porção de santos assim.
Depois, Paulo Gil foi embora para o Rio, foi embora para o mundo.
SC: Acho que o trabalho dele lá no Rio absorveu demais o Paulo Gil. Tirou Paulo da poesia.
SS: Glauber foi contra ele trabalhar na Globo. Mas, na verdade, Paulo fez muita coisa em sua vida. Você já viu na Internet, no Google, o que há sobre Paulo Gil? Ele tem uma filmografia incrível. Fez “Satanás na Terra do Leva e Trás” que é uma jóia de filme. Escreveu um livro sobre Corisco. E fez um documentário em que entrevista Dadá. Ela, naquele tempo, dava porrada na gente. Era preciso filmar escondido. Depois, Dadá começou a ganhar dinheiro dando entrevista sobre o Corisco e já não se zangava mais de ser entrevistada. Paulo também escreveu um livro sobre o cangaço. Ele fez muita coisa. Estou lembrando, agora, de uma ocasião em que fui ao Rio, fiz uma exposição na Galeria Ana Maria Niemayer e fiquei hospedado na casa dele.
SC: Sua galeria no Rio ainda é a Ana Maria Niemayer, não? E, aqui na Bahia, é a Paulo Darzé, não é isso?
SS: É, é a Darzé. Mas a situação está horrível. Ninguém está vendendo coisa nenhuma. Parou tudo, mudou tudo. Está muito ruim. Eu vendia muito para o exterior e até isso parou. Eu tinha uma marchand em Paris, mas ela se queixou de que havia muitos impostos e fechou a galeria. Ainda vendo, de vez em quando. Mas como antigamente, não. Meus quadros ficam mais difíceis de vender porque o pessoal aqui acha que são feios... Eu não procurei atender ao mercado, não me corrompi.
SC: Vi, não faz muito tempo, uma excelente exposição sua na galeria Paulo Darzé. Você não vendeu aqueles quadros?
SS: Vendi só quatro quadros. E todos para fregueses meus, amigos meus.
SC: Aqueles seus primeiros quadros, que você me mostrou na parede, quando entrei, do tempo em que você ainda estava na Escola de Belas Artes, ou tinha acabado de sair dela, tinham uma orientação digamos “moderna,” mas eram bem comportados. Quando foi que você deu essa virada para uma “arte do feio”? Quando começou a incluir o toque grotesco em seus quadros? O que o levou para isso?
SS: É difícil explicar certas coisas que vêm de dentro. Mas digo, agora, que sempre me fascinaram os ex-votos, aquelas cabeças toscas de madeira. Então, de alguma forma, passei dos ex-votos com cara de gente para gente com cara de ex-votos... Então, para mim o ex-voto assumiu a condição humana para expressar dor, amor, paixão, ódio. Minha maior preocupação é o homem, minha arte tem uma característica eu diria que antropomórfica. Fiz a minha arte sem me corromper e, mesmo não vendendo tanto quanto outros, vivi sempre bem, viajei, fui para a Europa, fui para os Estados Unidos, fiz exposições em uma porção de lugares, viajei a passeio, fui para Buenos Aires e entrei na primeira Bienal de Arte Contemporânea de Buenos Aires, tudo isso sem me corromper; vendendo para gente inteligente, principalmente estrangeiros.
SC: Você está com algum projeto, agora? Uma exposição, algo assim?
SS: Não estou projetando nada. Estou é trabalhando. Na verdade, é chato fazer exposição.
SC: Você continua trabalhando todos os dias?
SS: Sim, todos os dias. Este aqui (mostra uma tela), estou restaurando, estava mofado. Este é uma releitura de uma fotografia do século XIX. Eu fiz a mesma pessoa, mas é diferente.
SC: Você fez quase que uma colagem de duas coisas totalmente diferentes. Eu gosto muito disso. E acho muito bonita essa textura aí.


Os caras de pau



O BRASIL IMAGINADO POR DARLENE J. SADLIER

Darlene Sadlier

A simpática Darlene Sadlier, professora do Departamento de Espanhol e Português da Universidade de Indiana, em Bloomington, está com um importante livro novo, o sétimo de uma bibliografia já muito respeitável: “Brazil Imagined: 1500 to the Present,” University of Texas Press.
Darlene é autora de uma coletânea de escritoras brasileiras, “One Hundred Years After Tomorrow”, publicada nos anos 90 pela Indiana University Press e da qual eu, com muita honra, participo.
Ela esteve recentemente no Rio, mas infelizmente foi um encontro que perdi, porque estava às vésperas de viajar para Salvador.
O novo livro de Darlene claro que esclarece os americanos interessados no Brasil, mas também, sem a menor dúvida, esclarece a nós mesmos, com sua visão panôramica da nossa cultura e da evolução do senso de “brasilidade.”
Então, recomendo. Peçam o “Brazil Imagined” pela Amazon. É um livro que “junta as pontas” de muita coisa, na cabeça da gente, por se tratar de um olhar diferente, um olhar de fora, distanciado.
Deixarei que a própria Darlene explique o que desejou com o seu muito pesquisado e ambicioso livro sobre a cultura brasileira. Vão fragmentos da apresentação que ela faz do “Brazil imagined:”

“Meu assunto é o efeito ideológico relativamente evidente das belas artes, literatura, arquitetura, cinema e televisão na formação da “brasilidade.” As formas de expressão cultural que escolhi para analisar são obviamente determinadas por forças econômicas e políticas, mas em si contribuem para modelar a identidade nacional e nos fornecem uma janela para as lutas políticas e sociais. Vale a pena serem estudados por si mesmos e lhes foi dada relativamente pouca atenção, pelo menos no mundo acadêmico, nos termos em que tentei discuti-las.
O processo de selecionar escritores, artistas e obras foi um desafio, em parte porque eu etava cobrindo 500 anos, numa cultura em mutação. Em vez de um levantamento enciclopédico das artes, delineei uma série de momentos históricos, nos quais uma ou mais formas de arte se tornam dominantes ou têm grande influência. Assim, minha exposição do período colônia centraliza-se principalmente na cartografia e nas artes visuais, enquanto em meu capítulo sobre o século XIX dediquei a maior parte da atenção à literatura. Quando chego ao século XX, os materiais que estão sendo considerados são cada vez mais públicos, de modo que analiso arquitetura moderna, planejamento urbano, cinema e televisão. Também tentei investigar as maneiras nas quais tanto estrangeiros quanto brasileiros natos imaginaram o país. (...)”
“Meu objetivo (...) é concentrar-me no material brasileiro, ocasionalmente mostrando a relação entre os imaginários locais e os estrangeiros. Em todos os casos, indiquei os interesses e preocupações sócio-políticos e econômicos que desempenharam um papel no processo de fabricação das imagens.(...)”
“Também indico como a imagem do Brasil foi influenciada pela política e cultura de outros países, especialmente a França e os Estados Unidos.”
E vai uma relação dos títulos dos capítulos de “Brazil Imagined, para dar uma idéia de como se desenrola o livro da Darlene: “Encontros edênicos e canibais;” “O paraíso (re)conquistado: representações holandesas do Brasil e as imagens mentais nativistas;” “O Brasil régio;” “Os fundamentos de um imaginário literário nacional;” “O Brasil modernista;” “O Brasil da boa-vizinhança;” “O Brasil na tela, de revolucionário a distópico;” “País do futuro.”
O “Brazil Imagined” ainda agrada pelas belas ilustrações em cores.

CARLOS HENRIQUE SCHROEDER

Carlos Henrique Schroeder

O catarinense Carlos Henrique Schroeder, crítico literário , escritor e editor (Design Editora e Editora da Casa), já publicou oito livros, entre contos, romances e poesia. Os mais recentes são “A rosa verde”, Edusfc, e “Ensaio do vazio”, 7 Letras, 2006. No lançamento deste segundo livro, no Rio, um evento coletivo da editora, foi que o conheci. Há pouco tempo, C.H.S. me surpreendeu com esta crônica (saiu em “A Notícia”, jornal para o qual ele escreve semanalmente) sobre meu livro de contos “Uma certa felicidade,” reeditado pela 7 Letras. Obrigada, Carlos.

MULHERES

O relançamento de “Uma certa felicidade”, de Sonia Coutinho, no ano passado, acendeu novamente a ânsia de encontrarmos um verdadeiro olhar feminino na literatura. Publicado originalmente em 1976 e reeditado em 1994, a terceira edição conta com uma revisão feita pela autora e com a inclusão do conto inédito “O que fizeram com Zizi.” São oito contos que mostram casamentos infelizes, solidão, sonhos segregação familiar e o fim das utopias amorosas.
Algumas personagens se movimentam em cidades invisíveis, outras no Rio de Janeiro de manhãs altaneiras. O olhar apurado de Sonia está presente em todos os vértices, pois acredito que no Brasil poucas escritoras possuam sua potência de, com frases desconcertantes, conseguir desconstruir qualquer estereótipo feminino. Em “Uma certa felicidade,” as personagens de Sonia são egoístas, frustradas e enrustidas. Em 2007, fiz uma entrevista exclusiva com a autora, para o “AnexoIdeias”, e vimos que ela sempre esteve muito bem acompanhada: Clarice Lispector, Virginia Woolf, Katherine Mansfield, Marguerite Duras, Lygia Fagundes Telles, entre muitas outras. Se a formação de leitora foi exemplar, sua inquietação também.
“Descobri que queria ser escritora ainda menina. Meu pai era poeta e tínhamos muitos livros em casa. Eu era uma menina calada, introvertida, que adorava ler. Passei de um salto dos livros infantis para os livros adultos. E meus primeiros contos foram as redações das aulas de português, no ginásio. Um pouco adiante, fiz amizades com escritores e jornalistas de Salvador e publiquei pela primeira vez um conto num suplemento cultural local aos 19 anos.”
“Acho que, nesse início, eu poderia dizer que fui incentivada por esses amigos. Mas, como minhas histórias sempre foram desafiadoras, também me senti incomodada com críticas pessoais e certo tipo de preconceito, isto mais no círculo dos amigos da minha família, quando ainda morava na Bahia. Em certa medida, acho que isso ainda continua a acontecer por lá.”
Baiana de Itabuna, mas radicada desde 1968 no Rio de Janeiro, Sonia é um caso ímpar na literatura brasileira: seu livro de contos “Ovelha Negra e Amiga Loura” recebeu o Prêmio Clarice Lispector, da Biblioteca Nacional, como melhor livro de contos publicado em 2006.
Em 1979, Sonia levou o Prêmio Jabuti com seu livro de contos “Os venenos de Lucrecia”, feito que repetiu 20 anos depois com o romance “Os seios de Pandora.” Em 1983, a autora participou do International Writing Program, em Iowa (EUA) e foi escritora-residente na Universidade do Texas, em 1998. Seus trabalhos foram publicados em antologias no Brasil, Alemanha, Estados Unidos, Holanda, México, Canadá e Polônia.
Em sua obra, Sonia examina principalmente a mulher urbana de classe média e suas relações com a contemporaneidade, as relações de gênero, o descobrir e o entardecer da sexualidade e o envelhecimento como fenômeno sociológico e biológico. Nos dias de hoje , ler Sonia Coutinho é um verdadeiro manual de sobrevivência, em que mulheres podem se reconhecer e homens conhecerem um pouco mais do assombroso e deslumbrante universo feminino.

SUSAN E CRISTINA, AMIGAS AMERICANAS NO RIO

Cristina Ferreira Pinto (esquerda) e Susan Quinlan

Tive um encontro ótimo com duas amigas americanas que vieram ao Rio para um congresso. Almoçamos juntas e eu pude matar um pouco a saudade, porque já convivi com ambas por algum tempo, em diferentes ocasiões.
Uma delas é Susan Canty Quinlan (à direita, na foto), a outra, Cristina Ferreira-Pinto Bailey.
As duas são professoras universitárias, respectivamente na Georgia e na Virginia, mulheres de altas cabeças, com vários livros publicados sobre literatura de autoria feminina.
Cristina Ferreira-Pinto Bailey, além de ensaísta consagrada, é excelente poeta, já com quatro livros publicados, sendo o mais recente “Poemas da vida meia” (7 Letras, 2002).
Cristina me passou um poema – desta vez em inglês. Até então, eu só conhecia poemas seus em português. E aí vai:

Reading Kristeva

I

Shattering the body,
Crossing: Exile.

And thus the continuous
Desire for
Crossings
Traversing
Moving on
(even if not Forward):
An Escape.


II

Passional Ex-Re-pression

I oscillate
(have always)
Between
Propriety and
Careful spirit.
In the end:
I, neutral,
Like Sand.


Cristina Ferreira Pinto-Bailey

DISTANTE E PRÓXIMA, A ROMÊNIA DE DINU FLAMAND E JORGE SÁ EARP

Dinu Flamand e Jorge Amado em 1984

O poeta, tradutor e jornalista romeno DINU FLAMAND, atualmente residente em Paris, onde trabalha na Radio France Internationale, deu um depoimento exclusivo ao Sidarta sobre sua infância e juventude em seu país, sob a ditadura de N. Ceausescu. Postamos uma parte desse material na edição anterior, e aqui vai o resto.
Ano passado, Dinu esteve na Ilha de Itaparica, no programa de residências internacionais do Instituto Sacatar. Na foto, ele aparece com Jorge Amado, em Lisboa, em 1984.


DITADURA VERSUS POESIA
Depõe Dinu Flamand

Um dos meus poemas publicados na adolescência era um grito de desespero contra as condições de vida em meu liceu, onde eu era interno. Creio que evoquei com certo talento a atmosfera lúgubre que reinava ali. Porque, depois da publicação, o diretor tomou algumas medidas para melhorar nossa vida. Este continua sendo o único momento da minha vida em que um dos meus poemas influenciou a realidade!
Mais tarde, quando comecei os estudos universitários em Cluj, tive a oportunidade de encontrar outros jovens loucos como eu, que amavam a literatura e ignoravam desdenhosamente o poder político e a ideologia dominante.
Lucramos bastante com os movimentos estudantis que abalavam a Europa (prova de que o Maio de 68 parisiense serviu para alguma coisa!). Pedimos e obtivemos a permissão para editar uma revista de literatura. Nós a chamamos de “Equinox” e ela se tornou, da noite para o dia, um verdadeiro movimento independente, que escapava à propaganda. Muitas gerações de escritores romenos de hoje reivindicam a participação nesse movimento.
O que se queria era uma coisa muito simples: a ligação com a literatura mundial viva, que não a soviética. Vale destacar que publicamos pela primeira vez na Europa Leste, nos anos 70, traduções, entre outras, de Murilo Mendes e Herberto Helder, dois dos mais herméticos poetas modernos da língua portuguesa.
Todo esse orgulho que nos animava na época pode parecer ridículo hoje. Imaginem, de qualquer forma, a perplexidade do camarada da Censura, que não compreendia nada. Ele aceitava dar-nos a permissão para a impressão do jornal, pois ele não tinha nada contra o Partido. Mas não havia nunca uma tranqüilidade!
Dentro do espírito da “Equinox”, escolhi como título do meu primeiro livro um dos termos mais abstratos da filosofia grega: “Apeíron.”
Não havia textos abertamente contestadores. Mas creio que os iniciados obtiveram uma certa independência de espírito.
O livro ganhou o prêmio nacional para estreantes. O que me facilitou o acesso às páginas das revistas literárias centrais, onde comecei a publicar sobretudo ensaios e crônicas literárias, áreas menos visadas pela censura ideológica.
Cada livro de poemas publicado resultava de uma interminável negociação com a censura, por intermédio das editoras. Era preciso ser mais “esperto” do que eles.
E, cada vez, o livro da pessoa saía estropiado. Lembro-me de ter sugerido, para meu último livro publicado nessa época, um título inconcebível: “Exercícios de liberdade.” Escândalo! Antes mesmo que o resumo fosse submetido à censura.
Na verdade, aquilo foi uma estratégia calculada minha, para obter o título “Estado de sítio”! E ganhei! Era uma alusão às revoltas na Polônia, sem dúvida, mas também uma referência implícita ao permanente estado de sítio que havia entre nós.
Tive a astúcia de fingir que se tratava da condição comum de a todos os poetas. Uma espécie de “desassossego,” à maneira romena!
Mas esta foi minha derradeira tentativa de publicar um livro na Romênia. Tudo se tornou tão cansativo, abjeto, ridículo...
Pouco tempo depois, eu pediria asilo político na França. Eu não queria mais aceitar o verdadeiro estado de sítio que habitava em mim, no interior e no exterior, o de um monstruoso totalitarismo.
Na França, continuo a escrever minha poesia em romeno, mas os ensaios e os artigos jornalísticos eu elaboro algumas vezes em francês. Não sinto minhas comichões poéticas em outra língua.
O que não me impede até de traduzir para minha língua poetas como Pessoa, Vallejo, Carlos Drummond de Andrade,Samuel Beckett, Umberto Saba, Helder, Gamoneda, para citar apenas minhas traduções mais recentes.
Desejava profundamente fazer uma viagem iniciática ao Brasil, para me impregnar melhor dessa cultura que deu à luz Drummond, Vinicius, Murilo Mendes e Jorge Amado (que conheci em Paris).
Minha vinda até cá foi uma revolução, na paisagem demasiado calma das minhas sensações esmagadas pela vida européia.
Experiência incrível.
Vocês têm tudo o que há de mais “sofisticado” na civilização ocidental (falo sobretudo da poesia e da música); mas conservaram o contato direto com os fenômenos da natureza, o que me falta em Paris. Tudo brota, tudo explode, as coisas mantiveram este contato elementar com a terra. O camponês da Transilvânia que sou reencontra nisso suas fontes vivas, que o colocam em ebulição.
Voltarei, prometo!

DOIS POEMAS DE DINU FLAMAND
Tradução Sonia Coutinho

PETRARCA NA ESTAÇÃO FERROVIÁRIA DE AVIGNON

Petrarca na estação de Avignon e o rosto de Laura
refletido por um instante na janela do trem que passa
na linha paralela

vinte anos de amor celestial
com cansativos trens de um lado para outro entre Vaucluse Paris Gante Liège
Roma Pádua Veneza Praga Verona
onde logo chega a notícia da morte da Imaculada

em seguida vêm
outros dez anos de adoração ainda mais abstrata
depois da transferência dela para a mão direita do Pai

e agora cansado da sua persistência
ele lamenta ter-se abandonado à tempestade da sua paixão

se pelo menos ela fosse
algo além de um aperfeiçoamento do mero vício de esperar
instigado pela representação

(abundantes temas figurativos especialmente nas bancas de jornais
da estação
em prateleiras menos acessíveis supervisionadas
pelos olhos da câmara)

... e depois nada mais da alegria aumentada
apenas pela inanição
somada à saudade
que transforma o desejo em amor despojado de erotismo
aperfeiçoando-se como ausência
na infinita tentação

valete fratres

INTROITUS

com espanto
minha querida
com toda minha raiva e com todo
meu espanto
entrelaçados em seu colo
com raiva e com mais do que
toda raiva e todo meu espanto
e com mais do que todos os detritos que o
bloco de gelo da minha vida vai arrastando atrás dele
com um silêncio que não encontra sua mudez
e com um tremor de mãos vibrantes
e com toda a minha gaga urgência, salivando
a falsidade verdadeira das minhas falsas-verdadeiras palavras
que saem como sonâmbulas com o camisão de dormir da morte
e com todo o ardor grudado ao meu medo
de uma massa de madeira de cerejeiras azedas e molhadas sob uma chuva antiga
e com tudo o que não sei sobre o que penso que sei
e com toda a minha força eu poderia estar ausente de mim mesmo
ingresso clandestinamente na serenidade que
a surpresa da sua existência traz para a minha vida
eu me adio indefinidamente dentro de você




Dinu Flămând nasceu na Roménia a 24 de junho 1947, em Susenii Bârgaului, aldeia no Norte da Transilvânia. Começou os seus estudos na aldeia natal, a seguir em Brasov, e licenciou-se em letras em 1970, na Faculdade de Fililogia de Cluj-Napoca.
Participa nos anos de estudante na criação da revista Equinox em torno da qual se agrupará durante várias décadas um dos mais importantes movimentos literários da Roménia, marcado desde o início pelo espírito anti-dogmático e pela abertura a valores humanistas universais. Colocado em Bucareste, trabalha para diversas editoras e revistas literárias, entre as quais a Editora Enciclopédica, Amfiteatru e Secolul 20. Publica nessa época poesia, ensaio, reportagens e artigos de crítica literária mas, à medida que o clima político e cultural tende a se tornar-se cada vez mais sufocante e o controlo da censura a esmagar qualquer manisfestação de originalidade ou independência, orienta-se cada vez mais para traduções de grandes poetas como Fernando Pessoa, César Vallejo, Carlos Drummond de Andrade, Umberto Saba, Samuel Beckett, Pablo Neruda, Martin Booth, Herberto Helder, Miguel Torga, Sophia de Mello, Michel Deguy e outros – alguns deles incluídos numa antologia de poesia latino-americana, publicada nos anos 80 em colaboração com o poeta chileno Omar Lara.. Lança-se em 1971, com o volume de versos Apeiron, seguido de Poezii (1974) e Altoiuri (1976). Com Stare de asediu (1983) o tom da sua poesia torna-se mais polémico e a crítica ao regime repressivo mais transparente, de onde resulta que a censura impõe numerosos cortes, deformações ou mesmo supressões nos seus textos. Continua presente através de comentários literários, e publica dois livros de crítica: Introdução à obra de G.Bacovia (1981), um dos maiores simbolistas romenos, mais tarde comparado a Pessanha, num artigo publicado em Portugal pela revista Nova Renascença, vol. IX, 1989, e A intimidade do texto, em 1985.
Obtém em 1985 uma bolsa da Fundação Gulbenkian, e começa a tradução sistemática da obra de Fernando Pessoa, que só será publicada após a queda do regima comunista na Roménia. Um segundo convite a Portugal dá-lhe a possibilidade de no caminho do regresso ficar em Paris, onde em Março de 1989 lhe é concedido asilo político, e denuncia na imprensa francesa o regime opressivo do seu país. Após colaboração com os postos de rádio Free Europe e BBC, é actualmente jornalista em Paris, na Rádio France International..
A recolha de poesia Viaţă de probă (1989), com numerosos poemas inéditos e poemas restituídos em versão não censurada, que publica na Roménia depois da mudança de regime, marca a sua reintegração na paisagem literária do país natal.Seguir-se-ão os volumes Dincolo (2000), em edição bilingue, com tradução para francês de Pierre Drogi e ilustrações de Neculai Paduraru, Migraţia pietrelor, uma antologia (2001), com uma segunda edição em 2004, Tags (2002), Grădini (2005), em edição bilingue romena-francesa, com tradução de Claudia Fontu e Frigul intermediar, (2006). Uma parte do volume Stare de asediu foi publicado em Madrid em 1989, com o mesmo título de Estado de sitio, traduzido por Omar Lara, uma antologia poética bilingue, Poèmes en apnée foi editada em Paris (2004) pelas edições La Différence, com tradução francesa de Pierre Drogi, e a editora Tipomur de Tîrgu Mureş (Roménia) publicou outra antologia, In the Refracting Real, sendo a tradução para inglês da autoria de Olga Dunca.
Recebeu prémios da União dos Escritores da Roménia pela sua poesia e igualmente pela tradução do Livro do desassossego, assim como o prémio nacional Frontiera Poesis. Publica regularmente em revistas literárias e em jornais diários na Roménia e no estrangeiro, e traduziu ainda livros de Jorges Semprun, Philippe Sollers, Jean-Claude Guillebaud etc., tendo prefaciado traduções para romeno de Jean-Louis Curtis, Pascal Quignard e António Lobo Antunes.


JORGE SÁ EARP
“Mon ami, le hasard”

Jorge Sá Earp (Rio de Janeiro, 1955) é diplomata e já serviu na Polônia, Gabão, Bélgica, Equador e Romênia, onde se encontra agora, trabalhando na Embaixada do Brasil em Bucareste. A partir de 1980, Jorge já publicou mais de dez livros de contos, romances e poesias, sendo os mais recentes os romances “Legado” (7 Letras, 2007) e “O novelo” (7 Letras, 2008). Ele se sente muito identificado com o país onde vive agora, a Romênia, como vemos no depoimento que mandou para o Sidarta.



Jorge Sá Earp

A palavra Romênia ouvi soprada pela primeira vez da boca de meu pai: ele tinha voltado da Europa, na década de 60, e em Roma tinha se encontrado com uma senhora romena, advogada, no hotel em que se hospedaram. Me lembro dos olhos negros dessa mulher num slaide projetado na parede. Olhos que transmitiam uma alegria contida. Se não me engano ela estava vestida de preto. Meu pai contou que ela recebera uma bolsa para estudar na Cidade Eterna e sentia medo, medo de voltar ao seu país por causa do comunismo.
Depois meu pai me explicou que a Romênia era um país cuja língua tinha raiz latina, um país latino rodeado de povos eslavos. Aquilo aguçou minha curiosidade. Coincidência ou não (mon ami le hasard, como disse Colette) vim parar em Bucareste graças à minha profissão em 1999. Para ser mais exato, duas vezes neste país: daquele ano a 2003 e de 2006 até hoje.
Sob a influência do noticiário internacional de que alguns anos antes, Ceausescu, o ditador comunista, tinha destruído toda a parte antiga da cidade (logo eu que adoro antiguidades, vieilles villes), imaginava Bucareste completamente moderna, com blocos cinzentos à maneira dos de Varsóvia, onde também morei nos anos 80. Não estava errado de todo, mas cheguei do aeroporto pela Calea (é quase calle) Victoria, uma da artérias principais da cidade, que exala um charme todo especial de avenida antiga. Antes dei com um Arco do Triunfo e Denisa, funcionária romena da embaixada, me explicou que se tratava de construção de 1918 em homenagem à união dos principados da Valáquia, Transilvânia e Moldávia, que deu origem ao país hoje conhecido como Romênia, nome tirado mesmo de Roma, haja vista o orgulho que nutre este povo por guardar origens no Lácio. Tais origens se devem à vitória da legiões chefiadas pelo Imperador Trajano sobre os dácios no início do século II D.C. e sua consequente ocupação até cerca de 270 D.C. – centúria suficiente para que se consolidasse a cultura latina nesta região da Europa do Leste.
Da Calea Victoria desembocamos na Praça do Palácio Real, hoje Museu de Belas Artes, com excelente acervo que inclui quadros de Tintoretto, Rembrant, El Greco, Zurbarán e Murillo, belo edifício datado do final do século XIX mas ampliado pelo rei Carol II (o tal que se casou em segundas núpcias no Copacabana Palace no Rio em 1947) na década de 20. Em frente espanta a magnificência do Ateneu Romano, cartão postal de Bucareste, a Sala Cecília Meireles deles, erguido no ano da abolição da nossa vergonhosa escravatura, ou seja, em 1888. Para completar esse conjunto arquitetônico dei ainda com a Biblioteca da Universidade, prédio de estilo francês do século XIX e com o atual Hilton, cujos atuais proprietários resolveram alterar de maneira sóbria, a antiga fachada de um dos mais elegantes hotéis de Bucareste, o Atenée Palace.
Essa a primeira impressão: mais tarde fui conhecer Lipscani, o centro histórico, um tanto mal conservado, que me lembrou a Lapa. Aliás em Bucareste há muitas partes que me recordam Botafogo. O estilo das casas; embora em algumas se perceba uma nítida influência oriental-veneziana, como janelas com arcadas. Falando em estilo, na Romênia existe uma escola arquitetônica bastante própria que é a brancoveana, criado pelo príncipe Constantin Brancoveanu, que vai do meado do século XVII a cerca de 1730, com "loggias" e colunas ornadas de arabescos.
Para finalizar com a arquitetura da capital romena, não posso deixar de mencionar o imponente e maciço Parlamento ou Casa do Povo (Casa Poporului), erigido pelo mesmo Ceausescu que demoliu todo um bairro antigo (e aí a imprensa internacional não exagerou) tendo como pretexto o terremoto de 1977. Até igrejas ortodoxas do século XIII foram abaixo nessa fúria destruidora, exceto uma ou duas, transportadas para outros bairros por meio de uma tecnologia caríssima. Apesar de ser também cartão postal, não posso deixar de expressar minha desaprovação pela sua estatura pesadona e confeitada. É uma espécie de pirâmide de Kéops, a concretização da megalomania de Ceausescu, o segundo maior edifício público do mundo depois do Pentágono, segundo os guias que nos conduzem pelo seu enorme e carregado interior.
Como minha morada é a Literatura, fiquei fascinado com a poesia filosófica de Lucian Blaga (1895-1961). Viajei mesmo até perto de sua cidade natal, na região que abarca a cidade de Sibiu, capital cultural da Europa em 2008 e minha cidade preferida neste país. Por outra coincidência (ou por obra e graça do mesmo caro acaso de Colette) fui morar na Calea Mihai Eminescu, sob a proteção desse grande poeta romântico do século XIX, que para não fugir à tradição da escola, veio a falecer jovem também. Não tão jovem quanto os nossos Álvares de Azevedo e Castro Alves mas com 39 anos, louco, num asilo. Ambos, aliás, estão traduzidos magnificamente para o português.
No final de junho de 2007, fui convidado para a abertura da casa-museu do poeta Stefan Baciu, que viveu no Brasil 40 anos, trabalhou na Tribuna da Imprensa, tornou-se amigo de vários escritores brasileiros como Manuel Bandeira, de quem aliás foi biógrafo, e de Vinícius de Moraes. A embaixada do Brasil doou, na ocasião, à casa-museu os 2 volumes da Enciclopédia da Literatura Brasileira de Afrânio Coutinho e J. Galante de Souza, onde Baciu se encontra citado.
No teatro tomei conhecimento de Ion Luca Caragiale (1852-1912), considerado o maior dramaturgo romeno, boêmio, frequentador da Casa Capcha, antigo café de intelectuais, hoje restaurante chique, aonde ia vestindo uma écharpe vermelha. Li duas comédias dele: Noite Tempestuosa e A Carta Perdida, traduzidas por Ático Villas-Boas, especialista em Cultura e História romenas.
Ao mencionar o famoso Ionescu, meus amigos romenos torcem o nariz e dizem que é escritor francês, já que escreveu a maioria de suas geniais peças no idioma de Molière. Agora outro que vim a descobrir foi o jovem Matei Visniec. Assisti a uma montagem de obra sua sobre a vida do diretor de teatro russo Meyerhold, que realmente me apaixonou. Texto primoroso e elenco admirável.
Enfim, Bucareste é uma cidade com intensa vida cultural: cinemas, inclusive os de arte como a Cinemateca e o Studio, teatros, a Ópera, o de Operetas, o Nacional, museus etc etc. Capital de um país especialmente bem aquinhoado pela Mãe Natureza com praias ao longo do Mar Negro e a cadeia de montanhas dos Cárpatos, por onde se estendem as florestas da Transilvânia, região cujo nome ressoa misteriosamente no imaginário estrangeiro por causa do famoso personagem do escritor irlandês Bram Stoker, o Drácula (dragão ou demônio em romeno), baseado na figura do príncipe da Valáquia Vlad Tepes, conhecido como o Empalador, por causa desse severíssimo castigo que impunha ao invasor turco. É ali na Transilvânia que está situado, próximo ao vilarejo de Bran, o dito castelo do Drácula, na realidade tão somente posto da alfândega entre aquela província e a Valáquia, mas com o encanto de fortaleza medieval, onde o sanguinário príncipe teria se hospedado apenas uma noite no século XV. Sua cidade natal é a bela Siguichoara, que remonta o medievo, e onde o aparato turístico também atrai os turistas com souvenirs da mais variada espécie, respaldado na lenda criada por Stoker, que ofusca outros lugares bem mais interessantes, a meu ver, deste belo país.


Bucareste, 16 de julho de 2009.




NO DOMICÍLIO
Conto de Jorge Sá Earp


Da porta da cozinha Magaly olhou o marido esparramado no sofá em frente à telvisão que exibia um monótono jogo de futebol: a barra da camisa deixava à mostra, por causa de seus movimentos para bem se acomodar, a barriga branca desenvolvida. Ele engordara nos últimos tempos. Ângelo dobrou a perna enquanto palitava os dentes depois do almoço farto, do cozido executado com esmero por ela. Os filhos brincavam com um autódromo elétrico no chão, e a filha falava no telefone no quarto ao mesmo tempo que secava o cabelo. Esses ruídos incômodos provocaram uma reclamação do pai que ansiava pelo gol do seu time. Lá fora nuvens cinzentas e o vento fazendo chiar as folhas das maendoeiras anunciavam uma tempestade de verão.
Magaly se recolheu à cozinha e voltou a lavar a louça; não conseguia deixar o arsenal culinário besuntado de gordura como fazem rapazes solteiros que esperam a empregada vir na segunda-feira. E com as mãos debaixo da água morna da pia e coberta de espuma do detergente cantarolou suave: se sentia feliz com a tranquilidade dos domingos. Olhando a gordura se dissolver sob os jatos d’água, revia o calmo quadro familiar; e a música que lhe saía dos lábios assegurava essa segurança interior.
De repente, sem conhecer a razão exata lembrou-se de tia Dora. Há muitos fins de semana não a visitavam. Poderiam fazê-lo hoje logo que a chuva passasse e o jogo de futebol terminasse. Tia Dora não ia à missa. Nem eles há anos. Uma culpazinha amoladora por essa falta a espetava de vez em quando como um alfinete descoberto em roupa recém-comprada. Não, tia Dora não frequentava a igreja, por isso não haveria problema de aparecer de surpresa em seu apartamento lá pelas seis horas. A amável senhora deixara a religião depois que se casara com tio Alberico – lembrou Magaly dispondo os pratos lavados no escorredor. Tio Alberico ficou comunista desde que entrara para trabalhar no banco. Influência dos colegas dos sindicatos sem dúvida. Dize-me com quem andas... – ela ouvia o provérbio da boca dos pais desde moça. Porém, por sorte, graças a Deus, não castigara seu abandono da fé, não fora preso nem em 37 nem em 64. Escapara, ao passo que muitos dos seus colegas foram parar na Frei Caneca – coitados. Coitados não porque ateísmo é pecado e comunismo é ideologia russa, com o fundo objetivo de implantar a mesma ditadura de Moscou e de Cuba em nosso país. Pura ambição. Que horror... Já imaginou dividir seu apartamento – o nosso tão bom, tão espaçoso, com varanda e tudo – com uma família de favelados? Pois o governo fez bem em prendê-los. Depois acabam soltando e aí...
- Você resolveu ser cantora como a Luzilde? – Ângelo perguntou chegando à porta da cozinha e à sugestão dela de que fizessem uma visitinha a tia Dorinha provocou a esperada reação acomodatícia:
- Ah... hoje não... Depois do futebol tem um filme que eu quero ver...
Magaly então manifestou suas impressões sobre o comportamento estranho de tia
Dora nos últimos meses. Sempre tão recatada, nas vezes em que conversara com ela ao telefone, no entanto, parecia querer parecer mais jovem, ria à toa, emitindo gargalhadas mesmo sem necessidade.
- Tem mulheres que não sabem envelhecer. – o marido pronunciou esse julgamento sagaz.
Trovões atroaram, o vento levantou as cortinas, raios faiscaram e a chuva caiu rumorosa. magaly correu para fechar as janelas exortando os filhos que a ajudassem. Ângelo não se movia da frente da televisão.
Com o clique da última vidraça Magaly olhou a água caindo. Concluiu que a tempestade deveria demorar impedindo-os de qualquer maneira a visitar tia Dorinha.
Do outro lado da chuva, em Botafogo, Dora contemplava os pingos grossos de água, sem, contudo, cogitar do seu tempo de duração. Dali a pouco produziria a sua própria debaixo do box, sentiria o aroma de ervas do xampú, a textura do sabonete e o esfregar suave da esponja sobre a pele. Depois se arranjaria e se perfumaria em frente ao espelho, poria o seu vestido cinza e o colar de pérolas. A natureza lá fora eclodia em toda sua força e paixão.
Pronta, ligou o telefone e pediu capricciosa – a pizza de sempre. Nos domingos à noitinha era ele quem viria trazê-la. Como de hábito, distraiu-se com uma paciência. Da televisão somente apreciava os filmes passados mais tarde. Como Alberico, tinha um gosto especial pelos clássicos e rever aquelas fitas antigas sempre trazia aconchegante.
A chuva demorava a estirar e talvez por essa razão Adriano demorase tanto. Outro um raio seguido de trovão fê-la voltar mais intensa. As cartas deslizavam de suas mãos envelhecidas porém bem tratadas e iam se dispor imbricadas horizontalmente no feltro verde. Ao fundo a rádio MEC transmitia ópera. Quando ele chegasse diminuiria o volume e mudaria de estação, pois bem notara sua expressão de estranheza, como se o vozerio dos cantores o incomodasse como o rumor de aviões na pista do aeroporto. Mas deixou que a “Carmen” continuasse, já que estava em sua casa e gostava de ópera.
Segurou a caixa de papelão morna e foi depositá-la sobre a mesa de jantar enquanto sentiu os dedos quentes dele tocarem os seus. Não, não: não da primeira vez. Da primeira vez Adriano se mostrou bastante cerimonioso. E naquela tarde remota ele era simplesmente o rapaz da pizza. Que começou a vir com regularidade aos domingos trazer-lhe a capricciosa.
Não gostava de pizza, o Alberico. Ele tinha umas esquisitices. Dizia que era prato de criança. por isso pedia qualquer outra massa quando iam ao Bocaccio na Marquês de Caravelas... lasanha, fetuccine, ravioli, fusili... nunca pizza.
- Desculpe perguntar... mas é seu marido?
- Não tem que se desculpar...
Isso ele não perguntou da primeira vez. Da primeira vez foi muito polido. Via-se
que era um rapaz que teve boa educação...
- Puxa, mas não gostar de pizza... Eu sempre gostei. A gente sempre comia nos domingos. Minha avó é que fazia. E era sempre muito boa. Calabreza, ela gosta de fazer calabreza com catupiri.
Foi quando Dora convidou-o para se sentar. Sentiu que podia fazê-lo. Sentia-se que era um moço bom. E bonito, moreno, os cabelos encaracolados, os olhos vivos, grandes, castanhos. Tinha a afabilidade de um menino.
- Não tivemos filhos...
A fisionomia de Adriano então se desolou como se pedisse desculpas pela pergunta
que não tinha feito ou como se exprimisse pêsames.
- Você não quer comer comigo?
- Minha senhora... eu não posso... Tenho que ir... Não posso demorar...
- Ainda tem muitas entregas?
Respondeu ser a última com voz receosa.
- Então?
O rádio antigo tocava uma balada americana antiga.
Nunca ousaria convidá-lo não tivesse Adriano vindo entregar-lhe a pizza já várias
vezes. Na primeira vez fora educada, com uma secura conveniente. Nos domingos subsequentes fora adoçando seu comportamento em relação ao rapaz.
Depois do falecimento do Alberico, apesar das imensas saudades, fora se habituando ao silêncio da casa. No entanto erguia música e cores da paisagem da janela, com árvores que lhe acenavam com brandura e contemplava os objetos íntimos que a cercavam como os quadros – uma Vênus de Dacosta, uma Maria Leontina, aquele menino cubista, verde, de chapéu branco e o pombal amarelo na rua deserta - e peças de antiquário que comprara com Alberico em feirinhas de antiguidade de domingo ou mesmo em lojas mais caras de Copacabana. As amigas, por outro lado, iam falecendo e a última, Olívia, tinha-se ido no ano anterior. Com ela é que ia ao teatro e ao cinema. A distração das outras (as quatro ou cinco remanescentes) eram as cartas, o biriba, o pif-paf.
Aos poucos sombras foram emergindo dos cantos da casa, e Dora ali se foi fechando. Raramente saía, e os únicos parentes que tinha...
Ele se enrubesce, deixa cair na toalha fios de cebola e uma azeitona, que pesca delicadamente com a faca, gesto acompanhado da voz e do sorriso consoladores da anfitriã:
- Acontece, meu filho, ninguém reparou.
Dora se levanta, abre um armário e dali retira uma garrafa.
- Um pouco de vinho?
O sorriso fixo nos lábios, mas pairava uma sombra de temor em seus olhos.
- Eu não bebo em serviço, D. Dora.
- Mas não é sua última entrega?
Os olhos de Adriano brilharam, e ele acedeu.
- Não precisa me chamar de dona.
O entregador sorriu sem jeito, largou os talheres e descreveu um gesto com as mãos
como um malabarista que deixou cair seus objetos.
- Você podia ser meu filho. Ou melhor dizendo: meu neto. – ela acrescentou inclinando a cabeça com modéstia e candura.
- Fui criado pelos meus avós.
- Pois é, você falou da pizza da sua avó.
- A nonna.
Dora apenas sorriu, saboreou a massa e ofereceu um brinde. Adriano trincou seu
copo no da amável senhora.
A pizza terminada, só farelos de massa e tiras de cebola na caixa de papelão aberta em cima da cômoda, Dora abriu outra garrafa. Comentaram nomes de músicas atuais e “de outros tempos”.
- Minha avó gostava muito dessa.
- C’est très triste Venice...
- É, é, acho que é...
Dora então colocou boleros e tangos na vitrola.
- Mas então você é um rapaz romântico.
- Parece que sou. É, assim... um pouco...
Ia perguntar se tinha namorada, mas achou que podia parecer indiscrição; ou talvez
mesmo não quisesse saber.
- A senhora dança comigo?
- Eu? Mas... ora... não posso... já não sei mais dançar, meu filho...
- Vamu lá, D. Dora... Assim, como se dançava antigamente... A senhora me
ensina...
- Já disse pra parar com essa coisa de me chamar de senhora...
- Prefiro esse jeito antigo de dançar do que o de hoje... Separado...
A música evolava-se por toda a casa. Dora quis então uma valsa. E giravam,
giravam, enlouquecidamente numa valsa, la folie de la valse, até que a campainha tocou. Tocava insistentemente como se do outro lado a pessoa já tivesse tentado ser atendida várias vezes.
A porta foi aberta e no limiar sorriam sem-graça Magaly, Ângelo e os meninos.
- Tia Dorinha, que música alta! – Magaly franziu o cenho, hesitou em entrar e continuou: - com essa chuva toda, achei que você... até trouxe os meninos...
Dora soltou uma gargalhada esfuziante e inesperada, enquanto o rapaz aturdido meio que se escondia por trás da cômoda que servia de bar:
- Mas que surpresa agradável... Vocês virem me visitar... se lembraram então da sua tia Dorinha? Hem? Até que enfim... – e com os braços semi-erguidos tentou num gesto teatral convidar Ângelo para uma valsa.
- Tia Dorinha, por favor... E quem é esse rapaz? – interviu Magaly.
- Mas é o Adriano, vocês não conhecem? Venham aqui que eu apresento já já.
Os pimpolhos soltavam risinhos enquanto a filha encostava o corpo à parede junto à
porta de entrada de olhos arregalados para a tia primeiro e logo curiosos para Adriano.
- Isso é uma palhaçada! – bradou o sobrinho afim e acrescentou a meia-voz à mulher:
- Tia Dorinha está es-cle-ro-sa-da, Magaly!
- Não, ela está é bêbada! – contestou Magaly no mesmo tom.
E quando Dora ensaiou abraçar Adriano convidando-o para a dança, Ângelo
desligou bruscamente a vitrola. A tia então imobilizou seu gesto, virou os olhos lânguidos de Adriano para o casal, tomando uma expressão dura como se uma velha professora fosse surpreendemente repreendida pelos alunos.
- Mas eu estava só comemorando...
- Comemorando o que, tia Dorinha? – ralhou Magaly.
- O aniversário aqui do Adriano...
- Vamos, vamos, garoto, você já se divertiu bastante. – fez a sobrinha quase
empurrando o rapaz para fora de casa.
Dora soltou então um uivo desesperado, uma negativa altissonante e quando viu o rapaz desaparecer atrás da porta fechada descreveu um rodopio louco e caiu no chão aos prantos.
- Não, não, ela perdeu a noção das coisas. – concluiu Ânegelo.
Magaly decidiu:
- Leva os meninos pra casa que eu boto ela na cama. Depois apanho um táxi.

*
Na cama do hospital, passado o efeito dos sedativos, Dora balbuciou para
a enfermeira:
- Chama, minha filha, chama o Bocaccio...
A moça não entendia e pediu auxílio a um colega no corredor:
- A velha tá lelé. O Dr. Wilson já constatou isso.
- Ela insiste em telefonar pra alguém, mas não lembra o nome dele. Depois fica
falando num tal de Bocage... capricciosa... e não pára de chorar.
- A caprichosa quer é ouvir uma piada do Bocage... Você não entendeu.
E foi se afastando no corredor com a colega baixota, ambos rindo sem se
importar com a placa que exigia silêncio.

Bucareste, 3 de março de 2009.

PEDRO LYRA

A volta do Poema-Postal

Pedi uma explicação simples e Pedro explicou:
O Poema-Postal foi minha opção pela poesia de vanguarda, que ainda era forte no final dos anos 60. Lançado em fevereiro de 1970, era uma fusão dos experimentalismos anteriores, como o poema concreto e o poema/processo.
Minha inovação foi retirar o poema do livro e colocá-lo num cartão, como um postal comum.
O objetivo era conferir autonomia ao poema e facilitar sua divulgação pelo mundo, através do correio. Não era ainda a época do computador.
E hoje, com a internet, tornou-se mesmo uma prática universal – a única forma de poesia experimental ainda em vigor. E muito fortalecido pela mídia eletrônica.
A idéia do Poema-Postal surgiu por acaso, de repente. Estava visualizando um poeta concreto do meu amigo Horácio Didimo.

VIE*NAM
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.....ttt
...ttttt
..ttttttt
...ttttt
....ttt
.....t

e, de súbito, ocorreu-me acrescentar a ele um fundo vermelho, de sangue, e dispersar a letra t por cima, fundindo a “imagem visual” dos solados com a “imagem sonora” dos disparos.
E assim surgiu o primeiro Poema-Postal, que o “Jornal de Letras”, onde fiz o lançamento, publicou em sua primeira página.
Mas a ditadura não gostou e censurou no correio: mandei-o para uns amigos e ninguém recebeu. Fiquei um pouco desanimado, mas a reportagem do JL tinha sido vista por muita gente e a coisa pegou.
Depois, fiz vários outros, inclusive em Lisboa e Paris, em minhas temporadas européias, e agora volto com uma série de 61 novos Poemas-Postais, extraídos do meu livro “Argumento – Poe’m’ythos globais”, de 2006.
Estes não são textos experimentais: são fragmentos selecionados, discursivos mesmo. É que, tendo visto tanta coisa colocada no postal (quadros, esculturas, fotos, desenhos, frases etc) deduzi que podia colocar também o poema comum, desde que breve.
O resultado está aí – e pretendo fazer o mesmo com versos de outros livros meus.